Cida Zurlo e Mitzi Brandão *
SERÃO MESMO DANINHAS?
Elas povoam os terrenos baldios, as encostas dos morros, os fundos dos quintais. São as ‘párias’ da comunidade vegetal. Não precisam de muito para viver e sobrevivem mesmo em terras pobres em nutrientes. Já nascem incomodando, competindo ousadamente com as classes superiores. Se flageladas, podadas, sufocadas, ao primeiro ar fresco renascem alegres. Parem filhotes que geram outros rebentos.
Pragas e doenças tampouco as intimidam – elas ressurgem também do caos. Acrescente-se ainda que, mesmo sendo malvistas, elas quase sempre escapam aos agrotóxicos… São danadas as daninhas!
Pitaco Conceição Trucom: observe a imagem de topo, bem agro-horta, exemplo de coexistência ecológica! Plantas que passam por todos estes desafios são as mais resistentes, as mais fortes, as mais Super Alimentos.
Imagem beldroegão na agro-horta Doce Limão: co-habita espaço com
a tanchagem, alface crepis e até um pé de mamão.
Essas características – se olhadas sem preconceitos – ressaltam o fato de seu número ser pequeno para suprir as imensas necessidades alime
Essas características – se olhadas sem preconceitos – ressaltam o fato de seu número ser pequeno para suprir as imensas necessidades alimentares dos povos do Terceiro Mundo, já que, na verdade, as chamadas “ervas daninhas” podem ser usadas como novas fontes para a alimentação humana. Não estamos falando de novas plantas, pois elas estão aí há milênios. Basta que sejam olhadas de outra maneira. Basta que os hábitos alimentares sejam um pouco alterados. E é sempre bom mudar os hábitos…
De uma maneira geral, uma erva é considerada “daninha” quando não chega à mesa, o que é uma questão de costume. O caruru, por exemplo, foi trazido pelos portugueses junto com a couve. A couve manteve seu prestígio. O caruru – sabe Deus por que – caiu em desgraça e passou a ser pária na comunidade vegetal.
Na agro-horta Doce Limão o caruru branco (sem espinhos e não tóxico = comestível),
co-habita todos os espaços, mas com as batatas-doces é sua preferência!
Naqueles tempos coloniais a fartura das colheitas não podia ser devidamente aproveitada devido à precariedade do armazenamento. Pelo mesmo motivo, as especiarias vindas do Velho Mundo e da África nem sempre eram suficientes para abastecer os períodos de entressafra.
Assim, a necessidade de manter a mesa farta e variada levou nossos ancestrais a se servirem sem cerimônia das plantas nativas, cultivadas e/ou clandestinas (“daninhas”) em sua cozinha. Guisados e sopas trazidos de além-mar tiveram seus ingredientes paulatinamente substituídos: as até então “daninhas” beldroega, dente-de-leão, ora-pro-nobis, mostarda, labaca, serralha, trevo, major-gomes tomaram o lugar da couve-manteiga, da couve-tronchuda, da couve-de-bruxelas e novas receitas surgiram. As cambuquiras, as flores-de-bucha, taboas, munhecas-de-samambaia e muitas outras plantas enfeitaram os lombos, os pernis, as galinhas assadas, as peças de caça. O joá-manso, as amoras, o tomatinho, as capuchinhas, as gabirobas, os araçás, as flores de dente-de-leão, as sépalas da vinagreira, entre tantas outras, substituíram as refinadas geleias de maçã, ameixa e cereja tão a gosto do Velho Mundo.
Podemos dizer que a união das heranças do colonizador branco com o índio e o negro ou, melhor dizendo, essa miscigenação culinária, aliada à criatividade de nossos ancestrais, fizeram as delícias da mesa brasileira.
As autoras depois de pesquisarem dezenas de espécies nativas, selecionaram mais de 30 delas, consideradas popularmente como ‘daninhas’.
Em ordem alfabética:
-
- Amoras-do-mato
- Beldroega
- Capeba
- Capiçoba
- Capim-arroz
- Cardeal
- Carurus
- Caruru-do-reino
- Chaguinha
- Dente-de-leão
- Feijão-de-doce
- Fruta-de-pomba
- Jambu
- Joá-manso
- Jurubeba
- Labaça
- Lágrima-de-nossa-senhora
- Major-gomes
- Mariazinha
- Mastruço
- Melão-de-são-caetano
- Mostarda
- Ora-pro-nobis
- Samambaia
- Serralha
- Taboa
- Tanchegem
- Tiririca-amarela
- Tomatinho
- Trapoeraba
- Trevo
- Urtiga
- Urtiga-branca
- Vinagreira (hibiscus)
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(*) Texto extraído do livro Ar Ervas Comestíveis – editado pela Publicações Globo Rural em 1989. As autoras:
– Maria Aparecida Zurlo é professora, na época diretora do Jardim Botânico de Brasília.
– Mitzi Brandão tem mestrado em Taxonomia Vegetal pela UNB/DF, pesquisadora e na época responsável pelo setor de botânica da Epamig.
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