Laticínios sem leite? Especialista conta como substituir o leite de vaca por alternativas vegetais

Por Luciana Mastrorosa, do UOL
Matéria original AQUI
29/06/2017 04h00

A oferta de produtos sem leite e sem lactose vem aumentando bastante nos últimos anos. Dados da Euromonitor mostram que esse mercado cresceu 8% no mundo em 2015, e uma das causas apontadas é a crescente preocupação com a saúde e com intolerâncias alimentares. Junto a isso, tem aumentado também o interesse por alternativas vegetais, como leites e laticínios feitos à base de castanhas, grãos e cereais. Nesse contexto, o livro de Conceição Trucom, “Cadê o leite que estava aqui? Receitas e conceitos de leites e laticínios veganos” é uma alternativa para quem deseja abrir mão do leite ou simplesmente experimentar outras formas de se alimentar.

Conceição adota uma filosofia de vida baseada em uma alimentação natural, sem industrializados, há pelo menos 20 anos, quando também começou a escrever livros sobre o assunto. É autora do site Doce Limão, onde expõe seu ponto de vista especial sobre alimentação e propõe novas formas de preparar os alimentos, como receitas crudívoras e veganas, sem nada de origem animal. Conectada com as tecnologias, Conceição reúne quase meio milhão de seguidores nas mídias sociais, dividindo por ali também suas dicas e conceitos. “Meu discurso é sobre você ter lucidez, é sobre encontrar as soluções de uma forma amorosa, leve, para si mesmo e para as pessoas que o cercam”, diz ela. “Acredito muito numa alimentação baseada em plantas, sem muitos refinamentos, em que a gente sai dos industrializados”.

Conversamos com a autora para saber um pouco mais sobre sua filosofia alimentar e pegar dicas (e uma receita também: aprenda a fazer mousse de limão vegana) para quem procura alternativas ao leite de vaca:

Conceição Trucom, autora do livro “Cadê o leite que estava aqui?”

Leite sem leite: o que são as bebidas vegetais
Os chamados “leites” veganos são bebidas obtidas a partir de água e produtos do reino vegetal, como castanhas e cereais. Deixados de molho e, posteriormente, batidos no liquidificador e coados com pano, esses extratos são ricos em proteínas e gorduras, especialmente aqueles feitos com oleaginosas, como gergelim, girassol e amêndoas. Falei já um pouco desse tema por aqui. Os leites veganos podem ser consumidos puros ou entrar na fabricação de “laticínios”, como queijos cremosos e duros, iogurtes, sobremesas (como a tortinha de limão que a autora divide aqui com a gente) e pratos salgados. Para o leite, Conceição recomenda uma proporção de 1 xícara (chá) de sementes (previamente hidratadas ou germinadas) para 1 a 2,5 xícaras (chá) de água – de preferência filtrada ou solarizada (deixada por algumas horas no sol, em recipiente de vidro transparente, para eliminação do cloro). A ideia é obter uma bebida que tenha textura agradável, sem ser rala demais nem excessivamente grossa.

Como transformar leite vegetal em queijo e iogurte
Muito se discute sobre chamar de queijo um produto que não leva leite animal. Mas Conceição propõe que os produtos feitos a partir dos extratos vegetais sejam chamados, sim, de “queijos veganos ou vegetais”, já que podem ser elaborados seguindo as mesmas técnicas de drenagem, fermentação e afinagem que os produtos feitos com leite tradicional. O importante na fabricação desses laticínios veganos é sempre utilizar algum agente fermentador, como kefir de água ou rejuvelac (bebida obtida a partir de grãos de trigo fermentados). Eles contêm as bactérias do bem que vão transformar completamente o sabor e a textura desses alimentos. E, no caso de queijos de corte, deve-se lançar mão de recursos que tragam firmeza ao preparo. Conceição sugere o ágar-ágar, uma gelatina vegetal feita à base de algas e que, depois de pronta, não precisa de refrigeração para manter-se firme. Para os iogurtes, o agente fermentador também é fundamental. Conceição prepara iogurte grego com leite de coco fresco, kefir de água, ágar-ágar, água e melado de cana – com fermentação de 4 a 6 horas, fica cremosíssimo e pronto para comer.

Quanto tempo dura?
A autora é rigorosa em relação à segurança alimentar. Além de recomendar cuidados com higiene e ambiente sempre muito limpo, Conceição sugere produzir os alimentos em pequenas quantidades, o suficiente para serem consumidos na hora, especialmente as receitas que não passam por aquecimento. “Pode guardar por 24 até 48 horas, mas o sabor vai mudando”, diz ela. “Mesmo os alimentos cozidos, não recomendo que se guarde muito tempo na geladeira. Eles perdem suas características e aumenta o risco de contaminação”.

Dicas para enriquecer o sabor
Muita gente critica os laticínios veganos dizendo que não têm “gosto de nada”. “Tem gente que me escreve dizendo que provou todos os leites vegetais e que nenhum tem gosto de leite. Ora, não vai ter mesmo, cada alimento é único. E mesmo os leites de vaca têm pequenas variações de sabor”, lembra Conceição. “Mas eu acho que dá para fazer muitas coisas gostosas, sim, só precisa saber saborizar”. O caminho que a autora mais gosta de explorar é o das ervas, aromatizantes naturais. A dica aqui é não abusar dos temperos, usar só o suficiente para realçar os sabores delicados desses preparos. Vale também apostar nas especiarias.

Utensílios indispensáveis para quem está começando
Conceição indica dois eletrodomésticos fundamentais para a produção dos laticínios veganos: um bom liquidificador e, se possível, também um processador de alimentos. Além deles, aposte também em peneiras, colheres e xícaras medidoras, espátulas e panos para coar (a autora sugere o voal, mais fácil de lavar e secar). “Eu uso muito potes de vidro, sou a favor de reaproveitar tudo. E não é necessário um grande investimento para começar”, diz ela.

Ética animal na produção tradicional

Além das mais de 70 receitas com leites, queijos e vários tipos de pratos veganos, o livro de Conceição aborda bastante a questão da ética animal, apontando como a criação intensiva, de gado confinado, interfere não apenas na saúde desses bichos, mas também na nossa. A autora defende que, mesmo num leite de vaca produzido da melhor forma possível, ainda assim haverá alguns aspectos próprios desse alimento que podem ser de difícil digestão para o organismo humano. A caseína, proteína presente no leite animal, por exemplo, pode causar alergias. “Além disso, tem ainda os antibióticos que são administrados para as vacas, e, é claro, os hormônios produzidos especificamente para o bezerro, e que não foram feitos para nosso organismo”, diz a autora. “Então, se esse consumo é feito ocasionalmente, com moderação, tudo bem. Mas a gente vê que na maioria das vezes isso é só discurso”. Conceição defende um caminho de ética com os animais, eco sustentabilidade e consciência. “A verdade é que a conta não fecha. Para criar um mamífero feliz você precisa de espaço. E não há esse espaço disponível para produzir carne e leite para alimentar todos os habitantes da Terra. Então fica aquela coisa da hipocrisia, ‘eu tenho dinheiro, eu compro’ um leite de qualidade, de vaquinhas felizes. E quem não pode comprar?”. Visite o site da autora para conhecer em profundidade seu ponto de vista sobre alimentação: www.docelimao.com.br

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