Conceição Trucom
Final de ano e vem aquela demanda por renovação. Recebemos cartões, mensagens, convites, sugestões…
Contudo, devido ao fato do meu filho Guilherme ter casado recentemente (outubro 2011), esta urgência de ressurreição aconteceu bem antes. E, no turbilhão deste momento me veio, e compartilho, esta reflexão do Fernando Pessoa:
Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.
Pois é, fazem quatro anos que moro na Ilha do Guarujá/SP (desde out.2007). E meu propósito para estar neste novo lugar era praticar o mantra: MENOS. Mas a gente se engana, muda um pouqinho aqui, outro tanto ali e; seguimos com as mesmas roupas, mesmas posturas ao caminhar…
Então, voltando à ressurreição decidi: mesmo estando com as mesmas roupas, vou curtir mais o ‘lugar que habito’. Preciso caminhar mais, nadar mais, respirar mais, deitar na areia mais, tomar banho de chuva mais, fazer ‘nada’ mais…
Como minha vida se confunde 100% com o Doce Limão, meus livros, textos e palestras, comunico: estou desacelerando. Sinto que é preciso, que é essencial: para saber onde estou agora, para onde meu coração deseja caminhar, qual o meu horizonte? Sou e estou feliz com tudo o que já realizei até aqui. Mas agora sinto urgência em viver esta ressurreição… Ser ainda mais plena no essencial, na fonte e; abandonar os periféricos, as dispersões!!!
Nesta segunda-feira (19.12) tive que deixar o carro na revisão e combinei de passar a tarde com minha amiga Cris Pansiera, que mora na Praia do Pernambuco. Mas antes, fui de ônibus, almoçar na Praia do Perequê (*). Amo este lugar, que é simplesmente bucólico, com dezenas dos barcos da colônia de pescadores ancorados na praia, bem próximos à desembocadura do Rio dos Peixes…
Segunda-feira, 12 horas, dia ensolarado, porém fresco. Almoçando meu saladão num restaurante na beira da praia. Minha vista eram 2 famílias banhando-se nesta desembocadura. Eram crianças e adultos, homens e mulheres. Enquanto isso, canoas entravam no rio e saíam para o mar.
Não eram turistas, eram pessoas locais: caiçaras. Porque o turista acampa, vai de carro, barraca, cadeira, refri e cerveja.
Não, não, não: a minha paisagem mudava a todo instante. Os grupos vinham, brincavam, banhavam-se e iam embora, ao mesmo tempo novas pessoas chegavam… Senti que não podia me dispersar ou ia perder algo. Era tudo muito natural, espontâneo.
Neste envolvimento total, neste beber ‘a vida acontecendo’ me veio uma reflexão: tudo que eu estava percebendo como belo naquele momento, sempre ali está. O mar, o rio, as 2 margens de praia, aquela mata siliar, o sol, o dia, o morro, as pedras, os barcos, enfim… O que muda é a minha decisão de estar ‘habitando’ aquele lugar, percebendo cada momento e tudo ‘de essencial’ que me cerca.
Posso morar ou estar em qualquer lugar; mas ESTAR, habitar, receber, registrar é decisão pessoal. É aqui e agora e me plenifico OU nada, e perdi a viagem…
Então, decidi não mudar de roupas ou caminhos, mas curtir, de verdade, lentamente, os caminhos. Praticar os caminhos do meu habitat. Desacelerar para poder registrar, beber, degustar os caminhos do ‘lugar que habito’.
E, como compartilhei com você, deixo aqui este CONVITE.
(*) Perequê – O significado deste nome seria Pira-Ike=entrada de peixe para alimentação ou desova em tupi que se refere a um pequeno rio que deságua na praia, que é “o rio do peixe” que me refiro no texto. Quando a maré enche, algumas espécies de peixes e siris adentram no rio e na vazante alguns saem junto com a correnteza. É o caso dos siris que podem ser facilmente capturados, pois eles vêm rolando na forte correnteza. Nesse rio também pode ser encontrado lontras, capivaras e uma grande variedade de pássaros. A praia de Perequê está localizada a leste da ilha, após a praia do Pernambuco. Perequê é a maior colônia de pesca de Guarujá e também reduto de Caiçaras. No lado esquerdo da praia tem uma pequena cachoeira.
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