Vídeo: Que Limão é esse?

Neide Rigo *

No Brasil todo, de norte a sul, este limão avermelhado e às vezes enferrujado pode ser encontrado ancorado às cercas, solitário no meio dos pastos, nas franjas das matas ralas ou desprezado nas calçadas e terrenos baldios de cidades pequenas. Ou grandes – tenho um limoeiro deste aqui bem pertinho, numa praça.

Nas minhas férias no sítio dos meus avós, no Paraná, a bebida preferida das crianças era a limonada feita com ele. Para ficar bem gelada, a garrafa de água a ser usada era deixada imersa na corredeira do “corguinho” que passava por lá e às vezes uma casca em caracol do limão decorava o refresco. Não havia coisa melhor. Lembro ainda da garrafinha da lancheira de plástico impregnada com o cheiro desta limonada que eu mesma preparava e não conseguia esperar a hora do recreio para dar umas bebericadas. E o cheiro daquela lasquinha de limão-rosa que minha mãe botava no arroz-doce? Bastavam dois ou três pedacinhos para deixar o arroz todo perfumado. E no final eu gostava de comê-las mesmo sendo meio amarguinhas.

     

Ele (Citrus limonia Osbeck) não é exatamente um limão como o siciliano, mas sim uma lima ácida como o galego e o taiti. Originário da Índia, provavelmente é um híbrido de limão verdadeiro com tangerina, mas, botanicamente, está agrupado entre as limas ácidas e seu interesse maior é como porta-enxerto para outros cítricos, já que é resistente a uma série de doenças comuns no gênero. Por isto também é conhecido no reino dos produtores de cítricos como limão-cavalo. Sendo que para nós, que queremos usá-lo na cozinha, pouco importa saber se é um limão doce, uma lima ou uma tangerina ácida.

O que importa é saber que pode ser usado como limão em todos os preparos clássicos como limonadas, sorvetes, mousses, cremes, recheios, vinagretes (limonetes) e tantos outros. Com a vantagem de ser mais rico em betacarotenos (um precursor da vitamina A), mais adocicado quando maduro (mais rico em frutose que os demais limões), suculento mesmo quando verde e menos perecível que os outros limões – os limões da foto estavam guardados na geladeira, dentro de sacos plásticos, havia 60 dias!

Mercado: uma pena que não seja vendido facilmente nas cidades grandes. Está certo que nas pequenas cidades rurais o tal limão não tenha valor no mercado pois qualquer pessoa pode consegui-lo facilmente nos quintais ou nas redondezas: de graça, oferecido. Mas toda esta produção que se perde por aí, ou é abocanhada pelo gado, poderia ser aproveitada nas cidades grandes ou pela indústria para a produção de sucos, junto com tangerina. Por exemplo, para a limonada da merenda escolar em vez de sucos artificiais…

Agora, o que não falta a este limão são nomes, daí a ideia de filmar meus amigos do Slow Food de vários cantos do Brasil (durante um encontro em Pirinópolis – a maioria dos depoentes é líder de Convívio), contando como a fruta é chamada na sua cidade. Havia filmado outros depoimentos, mas perdi não sei como – leseira, na certa. E, claro, chamei minha amiga Inês Correa para editar, que aceita estes projetos voluntários na maior boa vontade. E a gente sempre acaba se divertindo com a ajuda dos filhos e dos amigos. O filho Lucas, de 15 anos, já tinha pesquisado a música; a Júlia, de 8, fica do lado para qualquer problema técnico na edição e também fotografa bem como a mãe – algumas fotos dos limões são dela. No meio do trabalho a Inês achou que precisava de um pé de limão rosa. Lá fomos nós para a casa da amiga vizinha Verônika fotografar seu limoeiro.

Foi uma surpresa em relação aos nomes, pois não imaginava que o apelido galego predominava. Aqui em São Paulo (e toda a região sudeste), galego é aquela lima ácida amarelo-limão também deliciosa e que também fugiu do mercado1 – dominado agora pelo taiti. E descobri ainda outros nomes curiosos lá mesmo em Pirinópolis, onde o feirante o chama de limão lava-tacho, certamente uma alusão ao seu uso, com sal ou fubá, para arear tachos de cobre, coisa que já fiz muito também – basta cortar ao meio o limão, encostar no sal ou no fubá e esfregá-lo na superfície de cobre (ou dos queimadores dos fogões à gás), que ficará livre dos verdetes e cheio de brilho avermelhado. Pode ser qualquer limão ou outro elemento ácido, mas como este foi e sempre será o mais abundante, é o preferido, e também porque é mais molinho e se ajeita à mão.

O nome mais aceito em trabalho científicos, pelo que vi, é limão-cravo, mas os nomes regionais não só confundem, mas também enriquecem. Por que não limão lava-tacho?

Abaixo, nomes internacionais para este mesmo limão, do site da Universidade de Purdue, onde poderá encontrar outras informações sobre este e limões similares: “Rangpur (Citrus X limonia Osbeck) is also called rangpur lime, rungpur, marmalade lime, lemandarin; Canton lemon in southern China, hime lemon in Japan; Japanche citroen in Indonesia; sylhet lime, surkh nimboo and shabati in India; limao cravo in Brazil”.

(1) O limão oficialmente classificado como galego tem sua produção concentrada nas regiões oeste e centro-oeste. No sudeste impera o Taiti e no Sul, pelo clima mais frio e serrano, existe a produção do limão verdadeiro, também conhecido como Siciliano. 

Frases em itálico são inserções da Conceição Trucom, autora do livro O poder de cura do Limão.

Leia também: Limão – Origem e variedades

Neide Rigo – Como Riobaldo …”Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa.” (Guimarães Rosa em Grande Sertão: veredas). Visite seu BLog: Come-se – Reprodução sob consulta à autora via [email protected]

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