Um estudo sobre obesidade e consumo de fibras

Por Alanna Collen*

Em seu livro 10% HUMANO temos acesso aos estudos do professor Patrice D. Cani** relacionando a obesidade e uma alimentação mais baseada em plantas, na verdade em fibras , alimentos perfeitos para manutenção de uma microbiota plural, efetiva na produção de compostos químicos que eles micro-organismos sintetizam quando decompõem a fibra alimentar, como por exemplo os ácidos graxos de cadeia curta, ou AGCCs.

Patrice D. Cani é o professor de Nutrição e Metabolismo que descobriu que pessoas magras têm níveis bem maiores da bactéria Akkermansia muciniphila do que pessoas com excesso de peso. Ele percebeu que essa espécie parecia estar encorajando a mucosa intestinal a se fortalecer, em parte forçando-a a produzir uma camada de muco mais
espessa. Com isso, essa espécie estava impedindo que a molécula LPS bacteriana transpusesse a mucosa do intestino e penetrasse no sangue, onde causava inflamação do tecido adiposo, resultando num ganho de peso nocivo.

Entusiasmado com a possibilidade de que a Akkermansia pudesse ajudar no processo de perda de peso – ou ao menos impedir seu aumento -, Cani experimentou incluir um suplemento dessa bactéria na alimentação dos camundongos. Funcionou. Não apenas seus níveis de LPS caíram, mas os animais perderam peso. Porém trata-se de uma solução temporária para um problema de longo prazo. Sem novos suplementos, a população de Akkermansia diminui. Então, como manter seus níveis altos? E o que é mais pertinente para a maioria de nós: como podemos aumentar a população que nós já temos das bactérias dessa espécie?

Patrice Cani descobriu a resposta tentando aumentar a população de outro tipo de micro-organismo: as bifidobactérias. Ao proporcionar aos camundongos uma dieta rica em gorduras, ele observara que a quantidade de bifidobactérias diminuía. Isso também se aplicava aos seres humanos: quanto maior o IMC, menos bifidobactérias essa pessoa possui.

Cani sabia que esse tipo de bactéria tem uma predileção por fibras, e se perguntou se fornecer um suplemento de fibra poderia aumentar sua população em camundongos sob uma dieta rica em gorduras e mesmo deter o aumento de peso. Ele experimentou suplementar sua alimentação rica em gordura com um tipo de fibra conhecida como
oligofrutose (fruto-oligossacarídeo ou FOS), encontrada em alguns alimentos, como bananas, cebolas e aspargos. Isso fez uma grande diferença: a população de bifidobactérias aumentou.

Mas embora as bifidobactérias tenham parecido prosperar com as fibras FOS, foram os níveis de Akkermansia que decolaram de verdade. Após cinco semanas, um grupo de camundongos ob/ob geneticamente obesos cuja dieta havia sido suplementada com as fibras FOS tinha oitenta vezes a quantidade de Akkermansia dos camundongos ob/ob que não tinham recebido o suplemento de fibra. Em camundongos geneticamente obesos, a ingestão de fibra reduziu a velocidade do aumento de peso e, nos camundongos engordados por uma dieta rica em gorduras, induziu a perda de peso.

Cani testou em seus ratos com obesidade induzida pela dieta outro tipo de fibra, chamada arabinoxilano. Essa molécula responde por uma enorme parcela da fibra encontrada em cereais integrais, incluindo o trigo e o centeio. Camundongos com uma dieta rica em gorduras suplementada por arabinoxilano tiveram os mesmos benefícios à saúde que os que haviam ingerido as fibras FOS. Além do aumento nas bifidobactérias, a população de Bacteroides e a de Prevotella também voltaram aos níveis encontrados em camundongos magros. Apesar da dieta rica em gorduras, as fibras vedaram o intestino permeável dos camundongos, encorajaram suas células adiposas a se tornarem mais numerosas em vez de aumentarem de tamanho, diminuíram os níveis de colesterol e reduziram o ritmo do aumento de peso.

“Se oferecemos aos camundongos uma dieta rica em fibras e gordura, eles conseguem resistir à obesidade induzida pela alimentação’: explica Cani. “Podemos argumentar que, se não adotarmos uma dieta rica em fibras para ‘compensar’ nossa alimentação rica em gorduras, isso terá um impacto deletério sobre a barreira do intestino.
Sabemos que nossos ancestrais tinham uma dieta riquíssima em carboidratos não digeríveis, comendo cerca de 100 gramas de fibra ao dia, aproximadamente dez vezes a quantidade que comemos hoje.”

Em nosso passado evolutivo, engordar era benéfico, permitindo que estocássemos energia em tempos de fartura para sobreviver às épocas de escassez. Portanto, é intrigante tentar entender por que o aumento de peso parece tão ruim para nós – contribuindo para o surgimento de doença cardíaca, diabetes e vários tipos de câncer. Muitos pesquisadores dizem que nosso peso atingiu proporções que vão tão além das expectativas normais do corpo humano que transpusemos o limite que leva às doenças ligadas ao excesso de peso. A pesquisa de Cani oferece mais uma pista da razão por que um processo que era tão benéfico ao longo de nossa história evolutiva se tornou tão prejudicial agora. Talvez comer gordura não seja tão ruim, contanto que haja uma quantidade suficiente de fibra na dieta para proteger a mucosa do intestino de seus efeitos. Se a ingestão de fibras estimula micróbios que fortalecem as defesas da parede intestinal, o LPS não penetra na corrente sanguínea, o sistema imunológico consegue se manter calmo e as células adiposas se tornarão mais numerosas – em vez de ficarem cheias, quase transbordando.

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(*) Alanna Collen tem mestrado em biologia pela Imperial College London e doutorado em biologia evolutiva pela University College London e pela Zoological Society of London. Texto extraído do seu livro 10% HUMANO – editora Sextante.

(**) Patrice D. Cani é professor de Nutrição e Metabolismo na Universidade Católica de Louvain, Bruxelas, Bélgica. PhD em Diabetologia, Fisiologia, Microbiologia.

20 de setembro de 2019

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