Linhaça e Sê-Mentes
SII - O intestino é o nosso segundo cérebro
Dr. Drauzio Varella - 24/11/2007
O INTESTINO é um órgão tão temperamental que os fisiologistas o consideram nosso segundo cérebro.
A seleção natural elegeu mecanismos neurológicos de alta complexidade para assegurar contrações e relaxamentos harmoniosos da musculatura intestinal, com a finalidade de fazer progredir o bolo alimentar: as ondas peristálticas.
Disposta ao longo do tubo digestivo, uma extensa circuitaria de neurônios conectada com o cérebro e com a medula espinhal controla o ritmo dessas ondas. Hormônios e mais de trinta neurotransmissores modulam os impulsos nervosos que trafegam de um neurônio para outro, para proceder ao ajuste fino da movimentação intestinal.
Quando os alimentos caem no estômago, esses neurotransmissores disparam o reflexo gastrocólico, verdadeira ordem para que as alças do intestino iniciem o movimento.
Um dos neurotransmissores mais atuantes nessa transmissão de mensagens é a serotonina. Como conseqüência, fatores que alteram a produção de serotonina ou modificam as características dos receptores aos quais ela se liga causam não apenas transtornos psicológicos, mas desorganizam as ondas peristálticas e podem provocar obstipação (prisão de ventre), diarréia, dispepsia e a síndrome do intestino irritável.
Estudos mostram que de 10% a 20% dos adultos se queixam de obstipação, e que a incidência nas mulheres é duas vezes maior.
Há dois tipos de obstipação crônica: o primeiro é caracterizado por lentidão do trânsito; no segundo, a freqüência das evacuações pode estar normal ou mesmo aumentada, mas o volume é reduzido e as fezes são difíceis de eliminar. Nos dois casos, fica a sensação de esvaziamento incompleto do conteúdo intestinal.
Existe uma tendência entre os gastroenterologistas de considerar a obstipação crônica parte da chamada síndrome do intestino irritável.
Antigamente conhecida como "colite nervosa" ou "síndrome do cólon irritável", nela não encontramos lesões patológicas, mas alterações no mecanismo de sinalização mediado pelos neurotransmissores e por seus receptores, que interferem com as ondas peristálticas, modificando os hábitos digestivos.
O diagnóstico é feito clinicamente, depois que o médico ouviu as queixas, pediu exames e excluiu a possibilidade de enfermidades mais graves. Sintomas como diarréia e prisão de ventre podem ocorrer no câncer de cólon e em doenças inflamatórias como a retocolite ulcerativa e a doença de Crohn, condições que exigem a realização de colonoscopia, para visualizar e colher amostras do revestimento interno do intestino grosso.
Vários critérios foram estabelecidos para padronizar o diagnóstico da síndrome: dores abdominais aliviadas ao evacuar, fezes amolecidas, evacuações mais freqüentes quando as dores se instalam, distensão abdominal, presença de muco nas fezes e sensação de que a evacuação foi incompleta.
Muitas vezes, os portadores dessa sintomatologia só buscam ajuda após o uso crônico de laxantes, lavagens e tratamentos caseiros inúteis.
São aconselháveis, em todos os casos: hidratação adequada, atividade física, alimentar-se em intervalos regulares e usar o banheiro sempre no mesmo horário para tentar estabelecer um ritmo.
Evitar comidas picantes, muito salgadas, com excesso de condimentos ou conservantes, doces concentrados e alimentos que provocam flatulência (feijão, grão de bico, repolho etc.). É preciso cuidado com o leite: 60% a 70% daqueles com mais de 60 anos apresentam algum nível de intolerância à lactose.
O consumo de fibras deve ser estimulado em caso de obstipação, mas evitado se houver diarréia. As fibras solúveis, como as encontradas em polpas de frutas e alguns cereais, ajudam a formar e compactar o bolo fecal. As insolúveis, presentes na casca das frutas, em alguns cereais e em todas as verduras, não têm capacidade de compactá-lo e funcionam como laxantes.
Embora sempre úteis, essas medidas podem ser insuficientes para controlar os sintomas: boa parte dos pacientes necessita de tratamento medicamentoso.
Não vai longe o tempo em que a síndrome do intestino irritável era interpretada como simples distúrbio alimentar provocado pelo estresse, em pessoas neurastênicas. Hoje, sabemos que se trata de uma doença crônica resultante de alterações neuroquímicas que interferem no ritmo dos movimentos peristálticos. O tratamento exige cuidados dietéticos, orientação médica e até medicamentos de uso prolongado.
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