Mundo ECO
Um destino correto para o lixo eletrônico
Por Denise Ribeiro, especial para o Instituto Akatu
Empresa que retira aparelhos sem uso de casa ajuda o consumidor e o planeta a se livrar da montanha de sucata tecnológica.
Ao comprar um eletrodoméstico ou um aparelho eletrônico no Carrefour, como uma geladeira ou um computador, os clientes poderão sair da loja sem a habitual dúvida: o que fazer com o aparelho quando estiver velho e precisar ser trocado? Graças a uma parceria do Carrefour com a empresa Descarte Certo, o consumidor pode ter a certeza de que o aparelho fora de uso será retirado de sua casa e destinado à reciclagem de alto padrão, que reaproveita os materiais e trata corretamente os possíveis resíduos tóxicos.
Assim como a garantia estendida, adquirida na loja mediante o pagamento de uma taxa extra, o recolhimento de lixo eletroeletrônico começa a ser oferecido ao cliente no ato da compra. Criada há um ano, a Descarte Certo presta esse serviço de maneira pioneira no Brasil. Ela não apenas retira os aparelhos em desuso em empresas e na casa do consumidor, como também se encarrega de encaminhá-los para o sofisticado processo de reciclagem que esse tipo de material requer. E o consumidor ainda acompanha pelo site o estágio de desmonte em que seu lixo eletrônico se encontra.
O serviço não é barato: a empresa cobra 152 reais para levar embora uma geladeira. Mesmo assim, há muita gente disposta a pagar o preço do descarte ambientalmente correto de seus aparelhos. “Fizemos uma pesquisa perguntando às pessoas se estariam dispostas a arcar com os custos da reciclagem dos seus aparelhos usados. Apenas uma de cada 10 respondeu que sim. No entanto, o número subiu para 6 quando se acenava com a possibilidade de retirar o aparelho na casa delas”, conta Lucio Di Domenico, especialista em marketing, tecnologia e administração e um dos sócios fundadores da Descarte Certo.
O cerne do trabalho da empresa é a gestão de todo o processo de desmonte e reciclagem do produto, começando por retirá-lo da mão do consumidor. Depois disso, o produto vai para um armazém onde é separado por tipo e categoria. Em seguida, entra na linha de desmontagem, quando é decomposto por tipos de material. Isso permite o reaproveitamento desses materiais — o plástico será destinado para empresas que reciclam plástico, o ferro para empresas que reciclam ferro, e assim por diante.
Montanhas de lixo eletrônico
O volume de sucata eletrônica, que cresce em proporções gigantescas no mundo todo, foi o que inspirou a criação da Descarte Certo. Milhões de computadores, videocassetes, aparelhos de fax, impressoras, celulares são aposentados compulsoriamente todos os anos – e ninguém tem idéia do que fazer com essa sucata ou sabe o que foi feito dela depois que sua vida útil chega ao fim.
Lucio Di Domenico calcula que, apenas no Brasil, sejam geradas cerca de 100 milhões de unidades de resíduos de equipamentos eletroeletrônicos (REE) por ano. Só em 2008 foram vendidos no país 12 milhões de computadores. A base instalada de PCs, incluindo as vendas projetadas para 2009 (também de 12 milhões), é de cerca de 55 milhões, informa a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee). “A vida útil deles é, em média, de 3 a 4 anos. Calculamos que mais de 5 milhões sejam descartados anualmente”, diz Domenico.
A maior parte desse tsunami eletrônico chega aos lixões sem o menor cuidado e podem provocar graves problemas ambientais e de saúde. “As pessoas nem imaginam o malefício que os REE podem causar. O homem está acostumado a reagir a ameaças físicas ou concretas, mas precisa de consciência e educação para entender aquilo que não vê nem conhece”, diz Domenico, explicando que a missão da Descarte Certo é ajudar as pessoas e as empresas a tornarem o mundo mais sustentável.
Os resíduos de equipamentos eletroeletrônicos (REE) contêm elementos tóxicos e cancerígenos. “Sua disposição no solo, em aterros ou lixões, é prejudicial à segurança e à saúde do homem e do meio ambiente”, afirma a pesquisadora Ângela Cássia Rodrigues, doutoranda no assunto pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.
O risco dos produtos tóxicos
A lista de elementos químicos embutidos nesses aparelhos que tornam nossa vida mais confortável é assustadora. “As substâncias mais problemáticas, do ponto de vista ambiental, são os metais pesados (mercúrio, chumbo, cádmio e cromo), os gases de efeito estufa, as substâncias halogenadas, como os clorofluorocarbonetos (CFC), as bifenilas policloradas (PCBs), o cloreto de polivinila (PVC) e retardadores de chama bromados, assim como o amianto e o arsênio 8”, recita a especialista.
Ela afirma que o processo de reciclagem desses produtos é complexo e requer a utilização de tecnologias avançadas, por conta dessa periculosidade e pela diversidade de materiais que os compõem. Por isso, não pode ser feito pelos 800 mil catadores brasileiros – os grandes responsáveis pela coleta anual de 6 milhões de toneladas de plásticos, vidros, metais e papéis em mais de 400 cidades do país. Sem eles, não atingiríamos a marca de 22% de reciclagem da fração seca do lixo urbano, maior índice entre países em desenvolvimento.
No entanto, a falta de equipamentos e de orientação para manipular o lixo eletrônico tem feito com eles desmontem um aparelho de TV, por exemplo, vendam o plástico ou a placa eletrônica e descartem o restante, causando um estrago tremendo ao meio ambiente. As telas de TV ou de monitores antigas, feitas de tubo de raios catódicos, contêm entre 2 e 4 quilos de chumbo, além de fósforo, bário e cromo.
Falta de dados
Ainda não existe um consenso sobre a quantidade média de REE gerada no Brasil e no mundo, apenas estimativas. O Greenpeace calcula que o descarte mundial seja de 50 milhões de toneladas por ano. De acordo com o Cempre (Compromisso Empresarial para a Reciclagem), isso representa 5% de todo o lixo produzido no mundo. Associação sem fins lucrativos que trabalha para conscientizar a sociedade da importância de reduzir, reutilizar e reciclar lixo, o Cempre também patrocina pesquisas e estudos relevantes sobre o setor.
“A reciclagem de eletroeletrônicos começa a avançar no Brasil. Alguns fabricantes, líderes de mercado, introduziram recentemente sistemas de logística reversa direcionados a consumidores. Já há empresas se especializando na coleta, desmontagem e destinação final dos REE”, afirma André Vilhena, diretor-executivo da entidade. Ele estima que o descarte de eletroeletrônico dos brasileiros estaria em torno de 500 mil toneladas anuais.
Lucio Di Domenico, da Descarte Certo, afirma que todos os anos são vendidos no país 45 milhões de celulares e que a nossa base instalada de usuários já chega a 170 milhões – praticamente um por habitante. O mesmo ocorre com os televisores, presentes em 92% dos lares brasileiros. “Somos 180 milhões de pessoas, e as vendas anuais de TV chegam a 10 milhões de unidades. Com o fenômeno dos LCD e das telas planas, a tendência é que milhares de aparelhos sejam trocados, agravando o problema da sucata eletrônica”, alerta.
A tendência é que cresça cada vez mais a oferta de serviços semelhantes aos oferecidos pela Descarte Certo. Mas, esse tipo de negócio só ganhará impulso, de fato, quando for aprovada a Política Nacional de Resíduos Sólidos, que se arrasta no Congresso Nacional, sem ser votada, desde 1991. A lei determina que os fabricantes arquem com os custos da logística reversa – ou seja, fazer com o que produto volte da casa do consumidor para o processo produtivo, com o reaproveitamento dos materiais recicláveis e o descarte correto do que não pode ser reutilizado.
Enquanto a lei não vem, o consumidor pode fazer a sua parte procurando causar o menor impacto possível na compra, no uso e no descarte dos produtos. Assim, depois de comprar, por exemplo, uma geladeira que consome energia com mais eficiência e de utilizá-la de maneira correta, para que gaste o menos possível, pode buscar empresas ou instituições que lhe darão a destinação correta, evitando que seja uma peça a mais nas montanhas de lixo eletrônico espalhadas pelo país.
Para saber mais sobre a Descarte Certo, clique aqui.
http://www.akatu.org.br:80/central/especiais/2009/um-destino-correto-para-o-lixo-eletronico
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