Conceição Trucom na apresentação do Crianças, bora comer!

Sinto que escolher ser vegetariana e crudívora é uma decisão que só me traz benefícios; na essência, é um resgate da minha ligação com a Mãe Terra. Afinal, ser ecológico começa na reflexão sobre a própria despensa. 

Ser vegetariano, felizmente, não é mais uma esquisitice nem excentricidade. Cresce o número de pessoas que buscam mais sintonia com a saúde e desejam ser mais amigáveis com os animais e o meio ambiente. São os seres ecológicos. Mas existe muito de idealismo e enganos, por isso é importante ter acesso a boas fontes de estudo e aprofundamento, para realizar uma acertada e proveitosa prática.

Porém, Crianças, vamos comer? pretende ir além do vegetarianismo, quando convida o leitor a refletir profundamente sobre ecossustentabilidade e se compromete a ampliar os horizontes de pais, parentes e profissionais responsáveis pela alimentação e bom desenvolvimento das crianças, na difícil missão de nutrir, com alegria, prazer e inovação, as futuras gerações do nosso planeta.

No início deste projeto, achei que poderia simplesmente reunir fontes dispersas sobre o vegetarianismo, para facilitar e acelerar tal processo, e acrescentar os conceitos do crudivorismo. Ledo engano. O vegetarianismo mais comumente adotado no mundo apresenta falhas gritantes e não atende a uma proposta de nutrir sem passar pelos tradicionais distúrbios digestivos e metabólicos, como o elevado consumo de laticínios, açúcar, cereais refinados, pães, massas e doces, alimentos muito cozidos, processados, industrializados, aditivados etc.

Tendo constatado essa triste realidade, fiquei ainda mais determinada a dar os primeiros passos em direção a um livro pioneiro – ao menos no Brasil – sobre alimentação crua e viva para as crianças de todas as idades.

A primeira infância é o período em que a criança desenvolve todo o organismo. É também quando se constroem bases para grande parte da potencialidade humana, seja ela física, afetiva, psicológica ou, principalmente, espiritual. Os distúrbios que se iniciam nessa fase serão responsáveis por graves consequências para os indivíduos e as comunidades do futuro.

As crianças que chegam não vão transformar o mundo? Pois bem, para alimentá-las com fontes de elevado poder nutricional (estruturais) e energético (para lucidez, inspiração e propulsão), teremos de aprender sobre os alimentos crus e vivos, seu preparo e suas combinações para ensinar às crianças que são mesmo gostosos e saudáveis, que essa alimentação vale a pena. Ou seja, a transformação do mundo começa ao nos transformarmos!

Não pretendo com esta obra catequizá-lo para o crudivorismo. Não tenho a intenção de que todo mundo venha a ser vegetariano ou que se alimente somente de vegetais crus e vivos, germinados e brotos. Minha pretensão é singela: fazer alertas e ampliar seus horizontes, opções, escolhas... Que se abram janelas da visão, olfato, tato, audição e paladar e todos possam conhecer novos caminhos, formas, cores, aromas e sabores. Reaprender a cultivar amores pela própria vida, por suas crianças, pelo planeta Terra!

No entanto, segundo levantamento realizado pelo Ministério da Saúde (1):

... o padrão de alimentação complementar – ao aleitamento materno – das crianças brasileiras é desfavorável: a alimentação é introduzida precocemente; a alimentação é monótona; o uso da mamadeira é muito frequente, mesmo entre as crianças amamentadas; os alimentos complementares não suprem as necessidades de ferro e, para as famílias de baixa renda (dois salários), não suprem também as necessidades de vitamina A. 

Eu diria mais. Essa alimentação não supre as necessidades nutricionais básicas, numa fase em que elas são fundamentais para todos os sistemas vitais. Não supre as necessidades da saúde plena, do SER pleno. Ao contrário, é um verdadeiro gatilho para desencadear problemas de saúde, cada vez mais precocemente.

Assim, com singeleza (minha e, espero, de cada leitor), desejo que este livro seja presença constante na parte “crua” de cada lugar onde habitem ou transitem crianças de todas as idades. Mesmo que com os quitutes da alimentação crua e viva se misturem receitas da sua família, cultura ou cotidiano. Desse modo, tenho certeza de que a proporção “crua” em sua vida vai aos poucos ganhar mais espaço, luz, cor, sabor, respeito, valor e amor.

Compartilho o ensinamento do dr. Gabriel Cousens (2):

Os lucros produzidos pelo estilo de vida mundial, ou Cultura da Morte, estão em conflito direto com nossa capacidade de zelar por nossas crianças e por nós. A capacidade de amar e cuidar de nossos filhos e de nós mesmos é uma característica saudável da Cultura da Vida. [...] Indo mais fundo no aspecto psicoespiritual, ao contrastar a Cultura da Morte com a Cultura da Vida, o que tenho a dizer é que “para a alma faminta nunca há alimento suficiente”. A Cultura da Morte cria uma experiência espiritual ansiosa e vazia, que tentamos satisfazer com a comida vazia. A Cultura da Vida, desde o princípio, enche nossa alma de amor, carinho e respeito pela vida.

(1) Ministério da Saúde. Saúde da criança: nutrição infantil, aleitamento materno e alimentação complementar. Caderno de atenção básica número 23. Brasília, 2009.

(2) Gabriel Cousens. A cura do diabetes pela alimentação viva, pp. 59, 68-69.

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