Audrey de Cassia Campos*
Posso dizer que tive uma alimentação relativamente ‘de bem com a natureza’ quando criança. Morava em um sítio, onde éramos supridos de todos os elementos necessários para uma boa alimentação. Lembro-me até hoje de ver minha mãe comendo, de tão fresquinhos, alguns legumes ainda no pé da horta: quiabo, vagem, etc.
Não tínhamos uma condição financeira que nos permitisse grandes extravagâncias. Assim, a carne era das galinhas, as frutas apenas as da estação. Bolo de milho ou curau só em janeiro ou fevereiro. E assim fui me desenvolvendo conforme o que nos doava a natureza, com suas estações.
Quando vim para São Paulo para cursar a faculdade de enfermagem, me deparei com várias doenças infantis que imaginava ocorrer apenas em adultos, salvo raríssimas exceções. E a mais impressionante delas foi a inflamação do apêndice: a apendicite. Quando aguda, se não socorrido a tempo, geralmente o paciente passa por uma extração cirúrgica, caso contrário, ela é responsável por elevada morbidade.
Em um hospital do ABC paulista onde tive a oportunidade de trabalhar na ala pós-cirúrgica pediátrica, em uma semana normal de trabalho, eram operadas de 4 a 5 crianças com apendicite. O que mais me impressionava era a idade dessas crianças: de 4 a 7 anos.
Lembro que nesta idade minhas únicas “anormalidades” eram joelhos esfolados e um pulso “aberto” por cair de bicicleta.
Na época, não tive a oportunidade de aprofundar os estudos do motivo que levavam aquelas crianças, tão precocemente, à sala cirúrgica. Mas em conversas com médicos e enfermeiros pediátricos, ficou muito claro que o motivo era a péssima alimentação das crianças, baseada em muito açúcar e gordura: poucas fibras.
Hoje, passados mais de dez anos e, sabendo que o quadro alimentar infantil não deve ter melhorado neste período, me faço as seguintes indagações:
- Como introduzir um novo conceito alimentar para uma criança que está cercada por tantas guloseimas e “gostosuras” nefastas para serem digeridas? Alimentos vazios...
- Como fazer os familiares entenderem que essa “nova” maneira de alimentar uma criança não a deixa com vontade de mastigar frutas, saladas e legumes? Já vem tudo refinado, processado, colorido e aromatizado...
Não estou tentando aqui fazer uma dissertação acadêmica, mas uma reflexão, sobre como em poucos anos conseguimos desarranjar tanto um organismo, de forma a ser obrigado a fazer um processo operatório, uma mutilação, antes mesmo de completar os 7 anos de vida?
Então: como podemos fazer o “caminho de volta”?
Essa jornada não é apenas do paladar, mas uma verdadeira mudança dos hábitos alimentares, mentais e éticos.
Posso dizer que estou re-iniciando esta jornada, um reencontro com uma velha amiga, da qual nunca deveria ter se afastado: a natureza. E desta forma vou buscar responder as questões que fiz acima. Em outras palavras, tentarei reencontrar minha essência, através de uma alimentação mais “limpa, viva e vital”, para assim conseguir passar para meus filhos e familiares, que a natureza nos nutre de tudo o que necessitamos para uma vida plena e cheia de alegria: naturalmente!
Nota: como os médicos de formação ortodoxa ainda não encontraram uma função clara para o apêndice, consideram um procedimento ‘natural’ a sua extração. Até porque quando a apendicite acontece é o único que se pode fazer para evitar uma infecção generalizada do abdômen.
Contudo, hoje já se vislumbra que a extração de amígdalas e apêndice gera conseqüências sim, como por exemplo, se extraídas antes dos 20 anos, maior probabilidade (em torno de 50%) de ataques cardíacos na idade adulta.
O apêndice intestinal é uma bolsa em forma de um dedo de uma luva, localizado no intestino grosso, que tem as mesmas funções na Medicina Tradicional Chinesa e na fisiologia ocidental: receber alimentos do intestino delgado, separar os fluídos e liberar o restante como resíduos. Geralmente, as disfunções no intestino grosso envolvem um transtorno em uma dessas atividades, normalmente devido a hábitos alimentares inadequados.
Outro dado triste é que se considera normal ter apendicite na adolescência (não na infância como constatado por mim fazem 10 anos atrás). Não seria muito mais educacional ensinar às nossas crianças, futuros adolescentes e adultos, bons hábitos alimentares, como o consumo saudável de fibras, ricamente presente nas frutas, folhas, legumes, sementes e cereais integrais? Que junto com a boa mastigação destes alimentos vivos, integrais, naturais, seriam uma bela prevenção para nos salvaguardar de inúmeros problemas digestivos e metabólicos?
Leia também: Alimentos refinados e nossas crianças
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(*) Audrey de Cassia Campos é formada em enfermagem e uma nova amante da alimentação viva.
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